SPFW51 | os movimentos de moda desta edição

01.07.21 | Moda


 

 

A estética esportiva já vem atuando nos movimentos de moda há algum tempo e de temporada em temporada ela sofre algumas reformulações que a atualizam e garantem que a tendência ainda permaneça em nossos radares. Nesta edição da SPFW essa atmosfera esportiva ganhou elementos que a deixaram com uma vibração futurista. Acessórios estruturados, recortes inusitados, texturas tridimensionais e a exploração de matéria-prima tecnológica imprimem esse clima de evolução do movimento.

 

 

 

As técnicas artesanais vinham sendo bastante utilizadas nas semanas de moda internacionais, portanto seria de se esperar que elas aparecessem com mais força por aqui também, especialmente porque o Brasil tem uma cultura artesanal riquíssima. Além de promover uma naturalidade nas criações, o que tem sido um movimento importante justamente por conta do nosso momento atual, essas técnicas geralmente enaltecem o trabalho de pequenos produtores com o consequente redirecionamento econômico para quem atua de maneira tão significativa e autoral no setor. Nesta edição da spfw, o crochê se mostrou uma das principais técnicas deste movimento e diversas marcas exploraram maneiras criativas de utilizá-lo e que fogem do clichê boho que geralmente associamos a esta trama.

 

 

 

Em um País colonizado, é comum que achemos o que vem de fora mais interessante. Mas não na semana de moda paulistana. Em um momento onde o Brasil está sendo tão negligenciado, incluindo o setor cultural, enaltecer as brasilidades que fazem o nosso País tão único e rico foi o caminho escolhido por diversos nomes desta temporada, principalmente por marcas menores. Nossa ancestralidade, nossas crenças, nossa natureza, nossas cores, nossos costumes e até nossa malícia serviram de referência para essas criações que se mostram verdadeiros atos de resistência. Da vida a partir do olhar dos caminhoneiros explorada pela Misci, passando pelos trajes que lembram as festas infantis feitas no quintal de nossas casas que podem ser notados nas criações lúdicas de Juliana Jabour, chegando na influência das religiões de matriz africana até os rituais indígenas e superstições nordestinas. O Brasil é grande e resiste.

 

 

 

Optar por cores sóbrias, composições discretas e marcas de conduta slow é um começo para aderir a um visual minimalista, mas nesta edição da spfw as criações com essa estética ganharam um nível mais condizente com o nosso momento, onde o conforto aliado à performance são características quase imprescindíveis para atravessar esse período desafiador. O visual minimalista desenvolvido por diversos nomes encontrou um dinamismo bem-vindo através dos recortes assimétricos, de intervenções que trazem mais riqueza e tridimensionalidade ao resultado final, como drapeados e plissados, das formas mais desprendidas e das construções singulares da silhueta.

 

As cores da SPFW 48

22.10.19 | Semanas de Moda Tendências


 

Nos despedimos de mais uma semana de moda de São Paulo e esta edição ficou marcada pelo gás dos novos talentos, pela preocupação com a sustentabilidade especialmente através do upcycling e pela inclusão. Uma diversidade de raças, corpos, orientações e idades deixou a SPFW muito mais aberta, representativa e interessante. No começo do nosso processo de mapeamento de conteúdos, vamos falar das cores. A maioria das coleções desfiladas são as da temporada outono/inverno 2020, portanto, tons mais escuros e tradicionais apareceram bastante, mas também dividiram espaço com matizes intensas que são menos lembradas nessas estações. Perceba também que as cores, mesmo as mais brilhantes, deixam de ser apenas um ponto de luz no look colocadas em acessórios ou uma peça. A proposta é que elas sejam usadas no look completo, seja em blocos de variações de uma mesma família ou monocromático. Veja as oito cores que se destacaram nessa edição e já se atualize para a próxima temporada.

 


 


 


 


 


 


 


 

SPFW N.48 | Handred

21.10.19 | Semanas de Moda


 

 

A marca carioca fundada em 2012 se define como sem gênero e sem idade, que abraça as pluralidades e preza pela matéria-prima natural, pela ampla variação de numeração e pelo bem-estar de seus funcionários. A Handred, como tantos outros novos talentos, se alinha com uma nova forma de produzir moda e é essa que inclui, que não rotula e que é fiel a sua própria identidade, independente de tendências.

 

 

 

Para o inverno da marca, André Namitala se inspirou na região da Costa Brava, na Espanha, e usou como referência o surrealismo dos também espanhóis Picasso e Dalí. As peças são muito leves, serenas e cabem em quaisquer corpos. Camisas, calças, batas e túnicas frouxas inspiram frescor e liberdade – bem inerente ao estilo de vida dos artistas que influenciaram essa coleção. Tons naturais deram o equilíbrio perfeito para as estampas superlativas que imitavam uma espécie de patchwork cubista. André também se valeu de uma transparência turva, colocada em camisas e vestidos longos em tons suaves de verde que traziam uma sensualidade branda à coleção. A base surrealista do desfile ficou por conta das estampas e das aplicações de círculos e contas metalizados e de madeira colocadas em kaftans, jaquetas e blusas. O casting foi diversificado não só em gênero, raça e corpos, mas também em idade – um movimento crescente nas passarelas internacionais, mas que ainda aparece tímido por aqui. A Handred fecha esta edição da SPFW que contou com uma gama de novos representantes da moda nacional, que mostram talento e dedicação para transpor as barreiras históricas do mercado e trazem o frescor das percepções de quem busca pensar e produzir fora dos padrões.

 

 

 
Fotos Zé Takahashi

SPFW N.48 | Neriage

21.10.19 | Semanas de Moda


 

 

A marca é tão jovem quanto sua fundadora, a estilista Rafaella Caniello que tem apenas 23 anos. A Neriage (se diz Neriagui) foi criada em 2017 originalmente para Rafaella apresentar seu trabalho de conclusão do curso de moda na Faculdade Santa Marcelina. Mas o olhar sensível da estilista misturado com sua técnica apurada, fez com que a Neriage saísse da banca do TCC direto para a Casa de Criadores. O processo para integrar a SPFW parecia natural a esta marca que logo ganhou a atenção do público e um lugar nos e-commerces mais badalados do País.

 

 

 

Nessa coleção, Rafaela demonstra um claro amadurecimento técnico e talento para a manipulação de matéria-prima nobre e a construção de silhuetas delicadas, porém modernas. A estilista também reconta na passarela uma de suas próprias experiências (quando viajou a Alto Paraíso, no cerrado goiano), através de um olhar sensível, onde a contemporaneidade inerente à marca não agride e não deturpa essas referências tão honestas. As cores da região goiana inspiraram Rafaela a usar nesta coleção terrosos fechados, azul-escuro, verdes e roxos profundos, ocre e tons arenosos mais claros. As construções da silhueta feita em camadas distintas emanavam conforto pelas modelagens mais soltas. Blusas, casacos que remetiam a quimonos e vestidos vieram com a cintura marcada e injetaram ainda mais delicadeza à coleção. O trabalho com texturas mais densas costuma ser um dos maiores códigos da marca, mas dessa vez as peças tinham maior liquidez e as padronagens marcantes foram substituídas por plissados sutis, tricôs finos e brilho discreto conseguido através das peças fabricadas em tecidos nobres e reluzentes. Coleção aristocrática, mas com o pé no chão.

 

 

 

 
Fotos: Zé Takahashi

SPFW N.48 | Isaac Silva

21.10.19 | Semanas de Moda


 

 

Isaac Silva fez sua estreia na SPFW com um desfile carregado de referências nas suas origens baianas. O estilista saiu da casa de criadores para o line up da semana de moda mais disputada do País sem perder a essência que fez seu trabalho ser reconhecido.

 

 

 

Isaac faz parte de uma nova geração de estilistas que se preocupa em manter viva a estética da roupa artesanal sem, no entanto, perder de vista os movimentos atuais. Integra, outrossim, o grupo de talentos negros que vem ganhando cada vez mais espaço em um evento ainda de maioria branca e elitista. Precisamos desse tipo de integração com a realidade e dar voz às pessoas que encontram dificuldade em ingressar neste universo por conta de anos e anos de exclusão e preferências por certos estereótipos e sobrenomes. E Isaac prova que incluir é o melhor caminho para nos depararmos com coisas novas que nos tiram da mesmice da zona de conforto. Em uma apresentação tocante, todos os convidados receberam galhos de arruda antes do desfile, ampliando as boas vibrações além do backstage. A coleção trouxe muitas referências às religiões de matriz africana, com búzios, conchas, redes, adornos de cabeça que remetiam aos orixás e o branco – único tom usado no desfile. Depois de uma leva de peças de pegada mais artesanal, a coleção seguiu mostrando vestidos amplos e dramaticamente recortados, conjuntos compostos de tops encurtados e saias drapeadas, camisas e saias fluídas e perfeitas para as festas de fim de ano, mais vestidos longos, dessa vez com shape desabado e adornados com detalhes cheios de um romantismo despretensioso, como babados e mangas morcego. Ao final da apresentação, aplicações metalizadas e de búzios foram colocadas em chemises, calças, blazers e saídas de praia que desfilaram em corpos diversos e deixaram clara a mensagem do estilista de que seu axé é para todo mundo.

 

 

 
Fotos: Zé Takahashi

SPFW N.48 | Apartamento 03

21.10.19 | Semanas de Moda


 

 

O Estilista mineiro Luiz Cláudio veio de uma família de costureiras e logo cedo se enveredou por esse caminho, criando, alguns anos depois, a apartamento 03, que hoje integra o grupo Nohda de Patrícia Bonaldi. Mas a trajetória do estilista até a SPFW não foi tão simples e antes de criar sua marca Luiz Cláudio trabalhou muito ao lado de sua mãe nas costuras diárias, atuou no ramo de design de cozinhas industriais e residenciais, onde percebeu a importância da criação e de cada etapa da construção de um projeto e trabalhou em diversas fábricas têxteis até fundar a apartamento 03, nome dado em alusão ao número do imóvel que ocupava, em Belo Horizonte.

 

 

 

O trabalho de Luiz é marcado pela delicadeza e pelas exímias técnicas de manipulação dos materiais que tornam os desfiles da Apartamento 03 extremamente autorais. Nessa coleção, o designer voltou seu olhar para o Butoh – dança típica japonesa criada após a Segunda Guerra e que expressa através de seus movimentos teatrais os sentimentos humanos frente às atrocidades vividas no período. Durante o desfile, o dançarino João Butoh se apresentava e recriava os movimentos fluídos e as expressões genuínas dessa arte, que também se manifestou na coleção. Modelagens desprendidas acompanhadas de texturas que variavam da suavidade do tule e dos tecidos mais nobres, para construções estruturadas e tridimensionais características do movimento japonista davam o tom da coleção que, assim como a dança que lhe serviu de inspiração, crescia na densidade de emoções conforme o desfile acontecia. Da sutileza e da feminilidade dos vestidos soltos, acinturados e transparentes à dramaticidade das peças mais profundas, sombrias e estruturadas, certamente a apresentação da apartamento 03 foi uma das mais sensíveis desta edição.

 

 

 
Fotos: Zé Takahashi

SPFW N.48 | Another Place

21.10.19 | Semanas de Moda


 

 

A principal proposta da Another Place é criar roupas sem rótulos e sem características de gêneros, onde qualquer peça pode transitar livremente em todos os armários. A marca tem uma atmosfera bem urbana e esportiva, mas com toques de sofisticação que são bem alinhados com o visual street da atualidade.

 

 

O desfile apresentado no Teatro Itália inovou ao entrelaçar cinema, música e moda com o objetivo de tornar as criações de Rafael Nascimento, estilista da marca, menos efêmeras e disponíveis, de alguma forma, para um público maior através das plataformas digitais que acessamos cotidianamente. Um curta metragem e sua trilha sonora foram o fio condutor da coleção, que manteve a veia streetwear chic e versátil da marca. Tanto o filme quanto as músicas estarão disponíveis para o público em breve em plataformas como Youtube e Spotify e possibilitarão que um maior número de pessoas tenha contato com a visão da Another Place. No quesito estilo, a marca apresentou uma coleção mais comedida, mas não menos bela. As peças-curinga do visual jovem urbano, em especial aquelas em jeans, se misturaram com outras mais nobres feitas numa alfaiataria polida e destacada por elementos de design diferenciados, como mangas bufantes e jogos de sobreposições que desconstroem a silhueta convencional.

 

 

 
Fotos: Zé Takahashi

SPFW N.48 | Amapô

18.10.19 | Semanas de Moda


 

 

A marca criada em 2004 pela dupla de estilistas Carolina Gold e Pitty Taliani tem DNA 100% brasileiro. A Amapô surgiu com a proposta de se diferenciar no mercado por materializar a cultura e irreverência brasileiras. Na Amapô as cores são sempre solares, a brasilidade é sentida em cada criação e a diversão é a palavra de ordem.

 

 

 

Dessa vez as estilistas viajaram até Cariri, no Ceará, para beber da fonte da vasta cultura da região. Todos os detalhes desta coleção foram inspirados no rico artesanato do local e cada história dos seus ilustres moradores foi contada na passarela. As criações da Amapô não foram apenas inspiradas em uma cultura local como acontece em diversas ocasiões com outros nomes do mercado, que se valem do trabalho regional sem real convertimento em benefícios para sua fonte de influência. Todos os looks que adentraram à passarela foram executados com a colaboração dos alunos do SENAC do Ceará e a história de parte da rica cultura nordestina foi contada de modo respeitoso, inclusive com a presença de Espedito Seleiro, lendário mestre no trabalho com o couro. O desfile foi uma profusão de tons, misturas e emoções e o aconchego da coleção podia ser sentido. A passarela foi transformada em um verdadeiro baile de forró e os modelos/dançarinos avançavam pelo percurso se movimento ao som do estilo musical. A grande sacada aqui é que a Amapô vai na contramão da soberba relacionada à moda. As estilistas ganham por não se levarem tão a sério e fazem história ao estabelecerem um comportamento despretensioso e divertido frente a rostos sérios cobertos por óculos escuros.

 



 
Fotos: Zé Takahashi

SPFW N.48 | Lino Villaventura

18.10.19 | Semanas de Moda


 

 

Lino é, com certeza, um dos nomes mais importantes da moda nacional. Seu trabalho autoral e visionário vem da experimentação sem receio, do uso de formas e texturas que conferem uma atmosfera utópica para suas criações e da liberdade de produzir muito além do trivial, transformando qualquer matéria-prima em luxo.

 

 

 

Segundo o próprio estilista explicou em seu instagram, ele não segue um tema especifico para suas coleções e cria conforme sua imaginação vai trabalhando. Apesar de não se fundar em um tópico especifico, suas apresentações acabam sendo muito coesas e fortes dentro de diversas propostas. É como se ao final, tudo fizesse sentido, mesmo que a ideia em seu principio não partisse de sentido algum. Lino entregou uma coleção extremamente feminina, mas impactante pela amplitude – de cores, de formas, de texturas e de técnicas. Os vestidos do estilista passavam a mensagem de uma sensualidade antiga e glamourosa que pouco se vê nos dias de hoje, onde ternos estruturados e materiais enrijecidos, por exemplo, é que constituem a sensualidade contemporânea. Plissados delicados, estampas florais bucólicas, transparências ousadas e metalizados se unem ora em peças longilíneas e esvoaçantes, ora em estruturas lindamente retorcidas de formatos orgânicos.

 

 

 

 
Fotos: Zé Takahashi

SPFW N.48 | Fernanda Yamamoto

18.10.19 | Semanas de Moda


 

 

Fernanda Yamamoto é uma das veteranas da SPFW, se apresentando no evento desde 2010. Mas a historia de Fernanda com a moda aconteceu bem antes, em 2007, quando seu trabalho começou a ganhar a forma e a identidade que a colocam como um dos nomes mais festejados do setor. Fernanda tem um estilo próprio e sólido, clientela assídua e uma maneira de criar muito única, que preza pela qualidade, técnicas tradicionais e sensibilidade para a moda com propósito e não pela quantidade.

 

 

 

 

Nesse desfile, Fernanda olhou para a própria história de mais de dez anos de sua marca e promoveu um upcycling de todas as suas coleções passadas, nos fazendo exercitar novos olhares para sua própria identidade. Os looks reconfigurados por Fernanda se transformaram em algo ainda mais extraordinário, teatral e digno das mais importantes passarelas pelo mundo. Trabalhos extremos de interferências criativas e manipulações surpreendentes dos tecidos formaram vestidos, saias, jaquetas e sobretudos esplêndidos, riquíssimos em texturas tridimensionais e proporções diferenciadas. A apresentação ainda foi mais carregada de emoção por trazer amigos, clientes, funcionários e parceiros da marca à passarela. O patchwork e as disposições extraordinárias dos tecidos criavam formas arquitetônicas e ao mesmo tempo fluídas e cheias de feminilidade. A profusão de texturas junto composição de cores e a indiscutível técnica do trabalho da estilista e de sua equipe aguçam os sentidos e provam que a moda nacional não carece de talentos, apenas de incentivos. Um desfile realmente emocionante.

 

 

 

 
Fotos: Zé Takahashi